CAPA - A arte em barro contada pelos Oleiros pernambucanos

A arte em barro contada pelos Oleiros pernambucanos

As mãos que batem firmes são as mesmas que acariciam, moldam, transformam e recriam a arte em barro. A arte mais crua, pura, reveladora de costumes, desejos. A face de uma comunidade esculpida entre os dedos. Essa é a leitura de quem chega ao Centro de Artesanato Arquiteto Wilson Campos Júnior, no Cabo de Santo Agostinho.

CENTRO - A arte em barro contada pelos Oleiros pernambucanos
Centro de Artesanato Arquiteto Wilson Campos Júnior (Foto: Ademar Filho)

Essa história teve início em 1970, quando um grupo de artesãos resolveu arregaçar as mangas, produzir arte em barro e comercializar peças em barro. Foram duas décadas de crescimento e pujança. “Eles tinham uma produtividade muito grande e se dedicavam aos utilitários. Mas no início dos anos 90 começaram a enfrentar o que seria uma década de decréscimo produtivo e grandes perdas econômicas. Então, partiram à fabricação de filtros de barro, o que garantia apenas a subsistência”, conta a pesquisadora do Laboratório O Imaginário, Germannya D’Garcia.

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Peças criadas no Centro (Foto: Ademar Filho)

O Imaginário é vinculado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e tem o objetivo de atender demandas relacionadas às produções artesanal e industrial, envolvendo professores, estudantes e técnicos de diversas áreas do conhecimento, integrando à extensão os segmentos de ensino e pesquisa da instituição. Junto ao Sebrae e outros parceiros, agem como consultores e fomentadores de recursos e novas parcerias, para que o Centro “ande com as próprias pernas” e siga somando bons resultados.

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Grupo conta com parceiros como O Imaginário (Foto: Ademar Filho)

“Nosso foco é a comunidade, o grupo. O Imaginário treina o artesão, faz diagnósticos, busca parcerias para que eles sejam capacitados em gestão, mercado, contabilidade, comunicação, tecnologia. O grupo tem o apoio fundamental da prefeitura do Cabo (que garante o prédio, a estrutura, água, luz, segurança), do Banco do Nordeste, da Copergás, da Roca, do SENAI, SEBRAE, Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, do Governo Federal e da Petrobrás”, explica Germannya.

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São 15 artesãos trabalhando diariamente no local (Foto: Ademar Filho)

Ela conta, ainda, que quando o Sebrae e O Imaginário chegaram à comunidade em 2002 encontraram os artesãos “escravos” do filtro. E que o diagnóstico foi de potencial gigante precisando ser reavivado, para que os artistas voltassem a produzir arte. “Eles tinham muitos problemas, mas o primeiro era que só faziam filtros, vendiam a R$ 5 reais e os atravessadores chegavam, colocavam duas velas e uma torneira e vendiam a R$ 40. Além disso, enfrentavam dificuldades com o forno (que não correspondia à técnica que eles queriam e precisavam usar). Eles queriam esmaltar as peças e buscaram o Sebrae para isso. A captação de argila também era um problema, além das questões de segurança do trabalho”, relembra.

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Trabalho em grupo move a produção acelerada (Foto: Ademar Filho)

Com os novos parceiros, a arte em barro passou pela reconstrução da imagem do grupo, para levar a imagem do Cabo de Santo Agostinho para o mais longe possível, para que a comunidade saísse dos filtros e dos atravessadores e para que os artesãos fossem os protagonistas de suas histórias.

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Anos de trabalho trouxeram autonomia e maturidade (Foto: Ademar Filho)

“Hoje eles se dedicam à arte. O ganho maior vem em uma palavra: autonomia. Existe a questão afetiva que nos une, mas eles conseguem trabalhar sozinhos, organizam suas finanças, administram as questões de gestão e relacionamento. Graças ao investimento público e privado e ao capital humano. Eles são cooperados sem formalmente ser uma associação. Trabalham em grupo, um aprendendo a ajudar o outro e todos ganham”, reforça.

O que você encontrará neste post:

Mestre Nena e sua arte em barro

A serenidade de quem lida com o barro há 50 anos e há três recebeu, do Estado de Pernambuco, o título de Mestre. A certeza de quem sabe bem os tropeços todos do caminho vencido e das conquistas de quem persiste, aprimora, segue firme, puxando outros e outras para cima. Assim, ele ajuda também a elevar a arte, os artistas, a técnica, a cultura e uma comunidade.

MESTRE - A arte em barro contada pelos Oleiros pernambucanos
Mestre Nena (Foto: Ademar Filho)

“Ajudava, aos cinco anos de idade, o pessoal da olaria que havia perto de casa. Comecei aprendendo a fazer telhas. Fui tomando gosto pela coisa, aprendendo e quando vi já não queria fazer outra coisa”, conta o Mestre Nena, uma espécie de professor, coordenador, mentor do grupo de 15 artesãos que fazem o Centro de Artesanato do Cabo de Santo Agostinho.

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Artesãos do Centro de Artesanato do Cabo (Foto: Ademar Filho)

Junto com ele estão Joselma (esposa de Nena), Dona Sônia, De Melo, Cida, Guel, Tina, Suely, Dinho, Deó, Fio, Diego, Joselita, Marisa e Otoniel. Junto à equipe, o mestre conta ainda com a ajuda da filha Deise.

“Nossa arte em barro se baseia em três pontos: utilitários, decorativos e figurativos. Fornecemos peças para Maceió, Fortaleza, Natal, João Pessoa e temos muita coisa que ganhou o mundo”, diz Nena. Ele reforça que o grupo, nos últimos 13 anos vem ganhando maturidade, força e espaço, expondo em feiras de Pernambuco, São Paulo, Minas, Brasília e do Rio de Janeiro.

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Cerâmica esmaltada mostra evolução (Foto: Ademar Filho)

“A Fenearte é nossa grande vitrine”, diz convicto. Tantos ganhos levam à vontade de espalhar a arte e fomentar novos talentos nas comunidades. “Vamos às escolas, com as nossas oficinas, e também oferecemos aqui. Na segunda semana de agosto teremos mais uma, aqui (no Centro), com o apoio do Funcultura”, avisa.

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Peças têm traços cada vez mais apurados (Foto: Ademar Filho)

Dos 15 que hoje produzem no local, 12 aprenderam com ele, num projeto da Petrobrás. O início garantia um salário e o que viesse com as vendas das peças. Esses discípulos veem, a cada dia, o progresso correndo junto ao tempo, levando os seus nomes e as suas crias a residências, espaços culturais, hotéis, restaurantes, feiras, pelo mundo.

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Produção do centro vem ganhando o mundo (Foto: Ademar Filho)

“Durante a Fenearte, cerca de 12 turistas norte-americanos vieram conhecer e comprar o nosso trabalho. Estou muito orgulhoso e agradecido. Já sofremos muito com atravessadores. Temos esse Centro, como é hoje, graças aos nossos parceiros. Sou recompensado pelo que faço. Vendo e é valorizado. Meus filhos nunca comeram nada que não viesse do barro. Tudo o que eles vestiram, viveram, comeram veio do barro. O barro para mim é começo, meio e fim”, diz o Mestre Nena.

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Peças passam pelo figurativo, decorativo e pelos utilitários (Foto: Ademar Filho)

O amadurecimento é visível. Para onde se olha, nesse espaço de recriação do mundo e reinvenção de sonhos, se vê a releitura de homens, mulheres, divindades, personalidades. Em pinhas, cabeças, carrancas, sanfonas, bonecos, tótens, luminárias e objetos diversos. Tudo pensado por cada homem e mulher do grupo, batido, socado e moldado no barro, que esquenta, esfria, esquenta, queima e esfria novamente, para ficar eternizado.

O processo

O processo da arte em barro  é único, pois trata com a terra, de onde se extrai o barro; a água, usada na modelagem da peça; e o fogo, que queima a peça e dá a resistência final. Francisco Brennand é uma grande inspiração para os artesãos e sua arte com barro.

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Produção em pleno processo criativo (Foto: Ademar Filho)

O barro é retirado de jazidas ou barreiros. O melhor barro é geralmente o mais profundo. Apesar de parecer tudo igual, cada barro tem uma característica, uma função e uma aplicabilidade. O barro retirado precisa passar por um processo de beneficiamento antes de ser moldado. São necessários testes e ensaios para determinar a melhor mistura de argilas para cada aplicação.

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Quando o trabalho, a arte em barro e a vida são um só (Foto: Ademar Filho)

Moldado somente com as mãos, ou através do torno ou mesmo com uso de moldes e o barro líquido (barbotina), esta é a fase de expressão do artesão e da sua peça. Muitas vezes, a peça não é feita de uma vez só, exigindo várias etapas e várias peças menores sendo combinadas para formar a peça final.

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O barro e o oleiro (Foto: Ademar Filho)

A secagem da peça, após moldada, demanda cuidados especiais, como secar à sombra para não deformar e as vezes um pequeno retoque para dar o acabamento necessário. Para algumas peças pode ser aplicado uma camada de esmalte cerâmico para garantir a impermeabilização e aumentar a resistência.

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No forno o segredo da finalização (Foto: Ademar Filho)

A queima é onde tudo se consolida. O barro frágil se torna resistente e a mistura de minerais em pó sem graça ganha cor e brilho completamente diferente de quando entrou no forno. Com temperaturas entre 800 e 1200ºC. É também a hora da verdade para saber se o esmalte saiu na cor desejada. A abertura do forno é sempre um momento emocionante. Os fornos usados no Centro utilizam gás natural, minimizando o impacto ambiental causado pelo processo de queima.

Centro de Artesanato Arq. Wilson Campos Jr.
(81) 3521.2744
(81) 98115.1400
(81) 3521.2774
(81) 98526.4873 – Nena

Rodovia PE 60 km 5 . COHAB
Cabo de Santo Agostinho . PE

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